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segunda-feira, 15 de abril de 2013

REFLEXÕES EM TORNO DO DITADO PARA O PROFESSOR NA EDUCAÇÃO INFANTIL


Fonte: 
Formando lectores e escritores
1º edición – Tandil -2004
Série: Cuadernos de Educación Y Prácticas Sociales



REFLEXÕES EM TORNO DO DITADO PARA O PROFESSOR NA EDUCAÇÃO INFANTIL
Laura Di Nucci e Ana Laura Isias

INTRODUÇÃO
Nossa meta neste trabalho é desenvolver o tema “Ditado para o professor” como uma situação didática de escrita, através do fundamento conceitual e da análise de um projeto implementado em uma sala de crianças de 5 anos.
A leitura e a escrita são práticas sociais, então ensinar a ler e escrever implica comunicar estas práticas[1] desde o início da escolaridade, conservando o sentido que tem fora da escola, mesmo quando se faz isso com crianças que não sabem ler nem escrever no sentido convencional do termo.
Por outro lado, o uso da escrita é um instrumento de tomada de consciência e de auto- regulação intelectual e é também instrumento para o desenvolvimento da construção do próprio pensamento[2].  Do ponto de vista da função epistêmica surge a necessidade do contato com a escrita e a possibilidade de ser produtor de escrita, de introduzir as crianças nos “fazeres” do escritor.
Concordamos com Ana Teberosky quando afirma  que “para as crianças pequenas é possível escrever textos inteiros antes de dominar a escrita adulta de palavras”. O desafio é compor textos, não recortar esta unidade de linguagem em frases e palavras isoladas.
“A inclusão dos alunos como participantes ativos da cultura escrita é uma responsabilidade compartilhada entre os níveis iniciais de escolaridade e do ensino fundamental. Há muito tempo se reconhece que a aprendizagem da leitura e escrita se inicia muito antes que as crianças ingressem na escola e que a educação infantil é um espaço fundamental para que esses processos sejam objeto de trabalho com os alunos”[3]
A investigação e a experiência didática têm mostrado que os docentes de todas as salas do nível inicial podem introduzir as crianças nas práticas de leitores e escritores e articular  resultados deste ensino  em diferentes contextos socioculturais.[4]
Compartilhar esta responsabilidade com a escola não supõe que a educação infantil assuma uma modalidade “escolar”. Tanto a organização particular de seus tempos e espaços como as expectativas do que devem aprender são diferentes.
A atenção aos aspectos da língua escrita como prática social supera a preocupação de introduzir as crianças somente ao sistema alfabético, tradicionalmente considerado a coisa mais importante quando se trata do acesso a língua escrita.
Considerando isso, nos diversos modos em que as crianças são colocadas em situações de aproximação com a  escrita, deve-se privilegiar os aspectos de  busca, construção e distribuição de significados.[5]
No interior destas atividades, conduzidas em grupo, se realizam interações e intercâmbios verbais orientados para a construção de textos de natureza diversa dirigidos a destinatários variados.[6]
O QUE É DITAR?
O ditado como prática social é uma prática com história.
O significado histórico que tem ditar a outras pessoas outorga sentido a esta prática social,  um sentido que a escola deveria preservar quando comunica esta prática.
Se resgatarmos o que ocorreu com a prática de ditar a outros através do tempo encontramos que o fenômeno da delegação da escrita se dá quando uma pessoa que deveria escrever um texto ou subscrever um documento solicita a outros que o façam por ele e em seu nome. Através dos séculos aparece a figura do “escrevente delegado”. Num período histórico este papel é assumido por um par da mesma classe social. Em outros momentos emergem profissionais da escrita que assumem a função de um verdadeiro escrivão público.
A categoria dos “escreventes delegados” na história é uma categoria de grande significado para o estudo do uso social da escrita. ”Constituiu um espaço de intermediação e de transmissão entre o mundo da oralidade e o mundo da escrita[7]
Como já foi mencionado se parte do pressuposto de que o ditado é uma prática de escrita.
Ninguém pôs em dúvida a autoria dos textos de Borges em sua etapa de cegueira.
“Ditar” é uma maneira particular de escrever, ainda que quem dita não escreva com suas próprias mãos, sem dúvida é o autor do texto que está ditando.
“Rodriguez Monegal diferencia duas etapas na vida de Jorge Luis Borges: a de escritor(a escrita de próprio punho) e a daquele que dita (a escrita resultante da voz de Borges e a mão de outros, quando o escritor começou a padecer de cegueira). Se tratava, neste segundo caso, de uma escrita em  voz alta. Rodriguez Monegal  sustenta que para um homem acostumado a usar uma caligrafia minúscula, aquelas limitações foram radicais. Teve que aprender um novo ofício, o de ditar. O escritor se converteu naquele  que dita. Aprendeu penosamente a ensaiar cada verso na cabeça. Quanto tinha o texto inteiro na memória, o ditava para sua mãe e esta o lia e relia para ele (com pontuação e tudo) até que ele ficasse satisfeito. Dois procedimentos diferentes, mas um mesmo autor”.
Ditar supõe então redigir oralmente um texto escrito e adequar o que se dita a todas as restrições do tipo de texto que se está produzindo; usar as formas e o léxico próprio do gênero, respeitar a estrutura que o caracteriza ou transgredi-la para produzir algum efeito particular. [8]
Por outro lado, ditar supõe ter em conta alguns aspectos importantes. Quem dita deve diferenciar entre dizer e dizer para ser escrito; deve controlar a extensão da emissão ditada e ir recuperando a ordem seqüencial daquilo que dita.
O Ditado ao professor: uma situação didática possível.
A situação de ditar ao professor é uma atividade que costuma realizar-se com freqüência na educação infantil. Sempre existem motivos: costuma-se ditar cartas, contos, mensagens, convites etc. Propomos aqui  outro olhar sobre esta situação e analisar assim uma série de conteúdos que têm a ver com os fazeres do escritor e de quem está ditando.
A situação de ditado ao professor traz como conseqüência a produção de um único texto. Todos produzem um só texto.
No desenvolvimento da mesma atividade, o adulto recolhe o texto ditado pelas crianças, “o coloca em letras”, o transcreve num cartaz a vista de todos, tal como foi formulado por seus alunos.
Desta maneira, assim concebido, o texto (enquanto se escreve) pode constituir-se em uma fonte de problemas, objeto de revisão, de possíveis reformulações.
Ao ditar ao docente, as crianças centram seus esforços no processo de produção das idéias e na forma de expressá-las por escrito. Podemos dizer que, a partir do ditado ao professor, se podem compor diferentes tipos de textos com diferentes propósitos, tais como:
·         As regras de um jogo, as normas de uso de uma biblioteca.
·         Uma carta para um amigo doente, uma petição, um agradecimento, para crianças de outro lugar.
·         Um texto informativo, uma notícia para publicar no jornal escolar.
·         Um texto científico para completar um folheto.
·         Uma resenha literária para publicar, um prólogo para um livro.
A situação que se analisará a seguir se deu dentro de um projeto institucional cujo propósito consistia na revalorização de contos clássicos.
Foram lidas diferentes versões de diferentes contos tradicionais e se tinha refletido sobre as características dos mesmos.
A professora propôs então para as crianças a produção de uma nova versão do conto Chapeuzinho Vermelho, mudando o final  da história. Junto com isso propôs também a edição de um livro e a incorporação deste à biblioteca da classe.
A partir desta proposta concreta as crianças sabem que vão escrever algo que tem um destinatário real cuja atenção terão que prender usado recursos característicos do gênero e têm claro  também que o produto final ocupará um espaço real na biblioteca junto com livros reais.
Para começar esta situação de escrita, em primeira instância, houve a necessidade de fazer acordos sobre as idéias que fariam parte da composição do texto. Assim, a professora tomou nota dos fatos pontuais que levariam a história adiante para evitar que perdessem o fio do que foi planejado. Isso é o que chamamos de planificação do texto que se vai escrever.
                Em outra instância começou a tarefa de escrever o texto sob ditado. A atividade consistiu em ditar para o professor esta nova versão de final de Chapeuzinho.
                O professor frente aos seus alunos em um grande cartaz foi escrevendo o que as crianças lhe ditavam.
                Queremos compartilhar com vocês agora, a produção final do grupo:
O LOBO SAIU DISPARADO POR AQUELE CAMINHO QUE NA REALIDADE ERA O MAIS COMPRIDO.  O LOBO HAVIA SE ENGANADO DE ATALHO.
CHAPEUZINHO CHEGOU MAIS RÁPIDO NA CASA DA AVÓ E SE DERAM CONTA DE QUE O LOBO AS ESTAVA PERSEGUINDO E SAIRAM CORRENDO. O LOBO VIU-AS E SEGUIU-AS.
A AVÓ E A CHAPEUZINHO ENTRARAM RÁPIDO NA CASA. JUSTO A TEMPO QUE CHEGOU O LOBO LHE FECHARAM A PORTA COM CHAVE E O NARIZ  FICOU PRESO E ESMAGADO ENTRE A PORTA E O BATENTE. A MAMÃE DE CHAPEUZINHO ABORRECIDA SAIU PELA OUTRA PORTA E LHE DEUUMA VASSOURADA NO TRASEIRO E O PAPAI FURIOSO TAMBÉM APROVEITOU PARA DAR-LHE UMA MARTELADA NA CABEÇA.
O PAPAI  ABRIU A PORTA E O LOBO DOLORIDO SAIU CORRENDO E UIVANDO RÁPIDO PARA SUA CASA. E NUNCA MAIS LHE TEVE VONTADE DE PERSEGUIR NINGUÉM NO BOSQUE.
                No processo que se atravessa para chegar a esta versão final, analisaremos os conteúdos que circularam nesta situação de ditado ao professor e quais intervenções do professor tornaram possível que as crianças assumissem as práticas de ditante e resolvessem problemas da escrita.
                Este processo que transcorre em alguns dias de trabalho está registrado em sua totalidade. Na continuação analisaremos só alguns fragmentos que exemplificam como se põem em jogo alguns conteúdos de ensino no transcurso da aula.
                Em primeiro lugar os exemplos referem-se ao que os ditantes fazem.
                No segundo lugar, os fragmentos referem-se ao que os escritores fazem.
Vejamos o primeiro fragmento:
                Embora o ditado ao professor seja uma atividade usada frequentemente com crianças pequenas, se nos basearmos no explicitado anteriormente sobre o conceito de ditar, esta não é uma prática simples para eles.
P[9]: Bom, como ponho? Quem me dita? Me dita “na realidade era o caminho mais comprido”.
Manuel: Alfonso sabe ler.
P: Manu, não faz falta ler. Tem que me contar, tem que me dizer para que eu escreva. Como colocamos? Relê NA REALIDADE ERA O CAMINHO... temos que por que o lobo havia se equivocado (se refere à planificação).
                Aqui se observa como não é transparente para as crianças a prática de ditantes, é uma prática que se aprende, e, a medida que se exerce, nos fragmentos do registro se poderá observar como  vão se apropriando dela. Como vemos, as crianças não entendem o que é ditar. Quando Manuel disse que Alfonso sabia ler, de fato é porque não entende que se espera dele quando lhe dizem “me dita”.          
                No próximo fragmento de registro se vê como os alunos vão se apropriando desse saber – a diferença entre o que dizem como interlocutores e como ditantes - e vão tomando decisões quando ditam:
P: “Que chegou o lobo”? Escrevo assim?
Ana – Não, estou te dizendo, ponha “chegou o lobo”
Os alunos decidem o que se escreve e o que não aquilo que se disse.
                Aqui Ana, está diferenciando “dizer” de “escrever”, está aprendendo a ditar. O professor com suas intervenções gera a necessidade de distinguir entre a linguagem da conversação cotidiana e a linguagem que se escreve.
                Resulta interessante comentar um problema que costuma apresentar-se quando o docente intervém em uma situação de ditado, que se vincula com os conteúdos que se comunicam no exemplo anterior.
                O professor em seu papel de “escrevente” também atravessa por um processo de aprendizagem, e no caminho dessa aprendizagem se apresentam problemas. Aqui veremos um exemplo, muito comum na hora de escrever sob ditado, no qual o professor tem o papel de textualizar.
P: O que ponho?
Ana: que a avó e a chapeuzinho entraram rápido na casa...
P: (ler e escrever) A AVÓ E A CHAPEUZINHO... como era Ana?
Ana: entraram rápido na casa.
Neste caso, o aluno não compõe o texto para ser escrito, simplesmente o diz e a  professora o textualiza por ele (suprime o “que”), não devolve o problema para os alunos. Não há intervenções específicas para que os alunos diferenciem o que se diz do que se escreve.
                Nestas situações os alunos também aprendem a coordenar os tempos do ditante e do escriba no transcurso da produção. Vejamos algumas passagens onde isso se observa.
Guilhermo: lhe fecharam a porta quando o lobo estava vendo por onde....
P: para, não posso escrever tão rápido (escreve e lê ao mesmo tempo) LHE... FECHARAM... A PORTA.
 Guille: lhe fecharam a porta com chave.
P: Para, CHARAM…
 Todos:… A...  PORTA… COM... CHAVE
Em outra oportunidade se apresenta uma situação em que se observa como os alunos se apropriam do ritmo de ditado.
P: (relê) O PAPAI TAMBÉM APROVEITOU PARA DAR-LHE... como continuamos?
Todos: (ditando) UMA ...  MARTE... LADA ... NO ... TRASEIRO.
                Aos poucos, os alunos vão ajustando a velocidade do ditado no ritmo do escriba ou mudam o tom de voz para anunciar que estão deixando de comentar para começar a ditar (voz ditante).
APRENDER PRÁTICAS DO ESCRITOR
                Junto aos fazeres específicos das práticas do ditante, os alunos também aprendem outros fazeres e conteúdos vinculados com a prática do escritor.
                Veremos aqui exemplos relativos a:
  1. Intervenção do docente para que os alunos consigam a adequação do léxico ao gênero que se escreve.
  2. Intervenção do docente que leva os alunos a resolver um problema de repetição de palavras em um texto.
Como se mencionou anteriormente, ditar um texto supõe adequar o que se dita a todas as restrições do tipo de texto que se está produzindo: usar as fórmulas e o léxico próprios do gênero. Vejamos um exemplo:
P: Como saiu o lobo?
Ana: Voando
P: Voando?
Bauti: Não, correndo. A los golpes... Rajando.(Mantida em espanhol)
P: Correndo? Somente correndo?
Sol A: E o papai perseguiu-o.
P: Somente correndo?
Ramiro:  Rajando (mantida em espanhol)
P: Ramiro, “rajando”, é uma palavra que usamos em um conto ou usamos para falar?
Todos: Não!!!!!!
Guille: Sim,  pode aparecer para que possa sair.
P: Nos contos?
Todos: Não
P: Além de correndo? Como mais?
(uma criança faz som de uivos)
Outros crianças: uivando
P: colocamos uivando?
Vários: Sim
P: Vamos ver...”saiu correndo e uivando rápido para sua casa.
Quando um dos meninos propõe “ rajando” , a professora intervém para que todos reflitam sobre a pertinência ou não deste vocábulo em um conto tradicional; é uma maneira de assegurar-se de que o texto que estão escrevendo se “pareça” com os textos do mesmo gênero que circulam socialmente[10].
Neste fragmento se vê, além disso, intervenções específicas que levam as crianças a “pensar” em agregar modificadores ao verbo ou ao substantivo para enriquecer  o relato e não cair numa história pobre  em recursos literários. (Uivando, correndo, aos golpes).
Continuando o registro, em outra passagem onde aparece uma situação similar sobre as atitudes da mamãe e do papai da Chapeuzinho, as crianças voltam a utilizar esse procedimento.
No trecho de registro seguinte se incorpora uma estratégia não conhecida pelas crianças para evitar as repetições: o uso dos sinônimos. Isto aconteceu no momento de revisão do texto completo, uma semana depois.
P: (Relê) ...  vejamos, Mercedes diz que aí estamos dizendo o mesmo.
Ana: Repetimos, “caminho” é o problema.
P:  Ah!  Vamos ver  outra palavra que diga caminho?
Alfon: Lobo.
P: Esperem, vamos ver este. Outra palavra que signifique caminho e que não seja esta.
Alfon: Parecida? Não tem. 
 P: Olhem, por exemplo, se vocês querem dizer… “casa” se pode dizer “lar”, se pode dizer “domicílio”, “moradia”. São sinônimos de casa. Em “caminho”, poderá haver outra palavra?
Todos pensam e alguns respondem: “caminito”(caminhozinho).
P: Não haverá nenhuma outra palavra? Caminhozinho,  caminho. Você, Alfonso, conhece alguma?
Não há resposta.
P: Faço-lhes uma pergunta, conhecem a palavra atalho[11]?
Alguns: Não
P: O que significa atalho?
(Estão confusos)
Ana: Um caminho que tem um pouco de subida.
P: Um caminho que tem um pouco de subida, diz Anita. Alguém acha que a palavra “atalho” é um pouco como  “caminho”? Vocês nunca ouviram?
N: Não
P: Vou lhes dizer que sim: atalho significa caminho, um caminho mais sinuoso, mais estreito; assim que “atalho”  podemos usar, em vez de “caminho”. Vamos experimentar?
 Sol A: Eu tenho um atalho na minha casa.
Ana: ¡Ah! Sim! Às vezes os atalhos estão entre árvores… ou às vezes quando sobem a serra...
Vários: ¡Sim, há atalhos!
P: Ah! Viram? Caminhozinhos por onde se anda.
Bauti: Em meu campo(sítio?) há atalhos.
 Ramiro: E no meu também.
P: Vamos ver como fica. (Lê)… O LOBO SAIU DISPARANDO POR AQUELE CAMINHO QUE NA VERDADE ERAO MAIS COMPRIDO  O LOBO HAVIA SE ENGANADO DE…
Vários: atalho!
p: Vamos por. Está bem? Estão de acordo até aí?
N: Sim. 
Neste fragmento se pode observar que, quando as crianças se dão conta da repetição de “caminho”, o professor mostra um procedimento diferente para resolver o problema: o uso de sinônimos. Em situações similares outros procedimentos tinham sido utilizados: substituição por pronomes e elipses.
É comum que o professor, na hora de transcrever o que as crianças ditam, resolva ela própria todos os problemas da escrita, tais como os anteriormente mencionados, perdendo assim uma maravilhosa oportunidade de trabalho com a língua escrita,totalmente  possível nessa idade.
É importante, então, tomar esses problemas que se apresentam e devolvê-los ao grupo para que as crianças utilizem estratégias diferentes na hora de solucionar problemas de escrita.
Estas situações analisadas, tanto as que têm que ver com os processos de textualização como aquelas de caráter mais discursivo como a coerência, os problemas de repetição de palavras em um texto, etc, dificilmente seriam objeto de reflexão em outra situação didática de escrita. Nesta idade, uma criança, ainda que possa escrever por si mesma, não faria por si mesma reflexões desse teor. Delegar ao professor o papel de escriba permite às crianças concentrar a atenção em questões de escrita como as mencionadas. 

Considerações finais
Algumas condições gerais para realizar essa prática:
  • Antes de propor  uma situação de ditado ao professor é importante explorar vários textos do mesmo gênero daquele que se vai escrever. Desta maneira, as crianças estarão imersos  nas características do léxico correspondentes  a esse gênero, estrutura, propósito, etc. Não é a mesma coisa escrever um conto (gênero familiar no nível inicial) e uma notícia.
  • É importante, antes de começar a produzir o texto, explicitar o propósito e o destinatário do texto e fazer acordos sobre o conteúdo do que se vai escrever. Isso ajuda a que a produção não tenha que desviar-se por diferentes caminhos perdendo a coerência ou o seu propósito.
  • Todos os membros do grupo (inclusive o professor) têm direito a fazer propostas referentes à escrita de cada parte do texto e de como escrever. E muito importante conseguir acordos sobre o que se aceita e o que não. É comum escutar as propostas de algumas crianças e avançar inconscientemente  com um grupo reduzido de alunos que vão combinando naturalmente as idéias.  Ou validar reiteradamente a mesma voz. Também ocorre, por ser uma situação com uma forte participação oral, que algumas “vozes” nunca sejam ouvidas. Muitos de nossos alunos não pedem a palavra, mas, de fato, dão sua opinião, se lhes dermos espaço.
  • A escrita na frente do grupo, à vista de todos. Uma folha grande de papel  ou uma lousa ajudam a dar visibilidade para grupo inteiro que esta ditando. Esta condição esta intimamente relacionada com a apropriação de conteúdos do sistema notacional como também com os processos de revisão e correção. O uso de cores diferentes na revisão ajudam a visualizar as idas e vindas que um escritor realiza quando compõe um texto.
  • Os tempos. Não e uma situação didática que sempre possa realizar-se em uma única aula. O acordo de idéias, o planejamento do texto em si, talvez ocupe um primeiro encontro.  Quando se vai produzindo a escrita do que as crianças ditam, ao estarem impossibilitados de ler convencionalmente por seus próprios meios, é o professor quem assume o papel de reler tantas vezes quantas forem necessárias para resolver uma situação e isso é muito cansativo para eles. É importante saber a hora de  interromper e retomar a situação poucos dias depois.
  • Finalmente, cumprir os propósitos faz com que se situe a escrita como uma prática social verdadeira e não meramente escolar. Se a proposta era fazer outra versão de um conto, é vital que esse conto seja editado e colocado na biblioteca. Se vamos escrever  um convite, que esse convite seja enviado a quem de direito, etc
Palavras finais:
O ditado ao professor oferece a possibilidade de incluir os alunos do nível inicial como participantes da cultura escrita por meio de situações de aproximação a ela. E, por outro lado, de  ressignificar o ditado ao professor (tão usado no nível inicial) como uma situação recheada de possibilidades para “colocar” as crianças em posição de escritores reais e com propósitos concretos.
Outra questão importante a resgatar é que o professor ensina a ditar. Diferenciar entre “dizer” e “dizer para ser escrito” implica um processo de construção que favorece, a partir de intervenções docentes específicas, que a criança seja o verdadeiro autor do texto e esta situação se transforme assim em uma situação de aprendizagem, reflexão e discussão sobre os problemas da linguagem escrita. 
Por isso é uma situação valiosa quanto às possibilidades de aprendizagem dos fazeres de escritor. Seja para aqueles que ainda não escrevem convencionalmente (problema que se delega a quem transcreve), seja para aqueles que já o fazem, mas necessitam outras instancias de reflexão. (E:G:B)
Da mesma forma, tomar consciência de que tipos de intervenções docentes são fundamentais para as crianças refletirem sobre as questões da linguagem escrita para que estas se transformem em objeto de conhecimento.
Ditar a outros  é uma prática social com significação histórica que a instituição escolar assume como pratica de escrita a ser ensinada desde o início no Nível Inicial. Não obstante, escrever em voz alta é uma situação didática para se propor em toda a escolaridade, já que envolve aprendizagens específicas quanto aos fazeres  do escritor.
BIBLIOGRAFIA
Castedo  Mirta e outros. Propuestas para el aula. Material para docentes. Inicial. Ministerio de Educación de La Nación 2000.
Lerner Delia (coord.) Prácticas del Lenguaje. Prediseño curricular. GCBA, 1999.
Lerner Delia. Lectura y Escritura. Apuntes desde la perspectiva curricular. Textos en Contexto No 4. Revista Lectura y Vida, 1999
Pascucci – Rossi (2001) Ressegna di Psicologia No 1. “Non solo escriba” (Art)
Petrucci A. Alfabetismo,  escritura y sociedad. Col. LEA. Barcelona.
Teberosky, A.  Y los dictantes?  En Aprendiendo a Escribir. Cuadernos de Educación No 8.









[1] Lerner  e outros, 1999
[2] Emig 1977, Olson 1977, Apeleebee 1984
[3] Castedo e outros, 2000
[4] Lerner e outros, 1999
[5] Bruner,1992
[6] M.Passucci, F. Rossi, 2001
[7] Petrucci, Col.Lea, Barcelona
[8] Teberosky, Ana. Cuadernos de Educación 8
[9] Professora
[10] Pre desenho Curricular. Governo da Cidade de Buenos Aires, 1998
[11] No original “sendero”.

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